Bancos
Mexer na meta de inflação pode aumentar mais ainda os juros
Para economista-chefe do Credit Suisse, Solange Srour, país está perdendo a ‘âncora fiscal e monetária’
Os ‘estragos’ provocados pela insistência do governo federal em interferir na política monetária do país podem ser maiores do que se imagina. Que o diga a economista-chefe do Credit Suisse, Solange Srour, para quem o aumento das metas de inflação “poderá ampliar a desancoragem das expectativas, além de prejudicar a credibilidade do Banco Central (BC), e o que é pior, demandar um novo ciclo de aperto monetário”.
“Estamos perdendo a âncora fiscal e monetária”, sentencia a economista, ao observar que a iniciativa do Executivo representa uma ameaça à confiança na economia nacional, em decorrência da deterioração de perspectivas para a política fiscal, e diante da falta de uma sinalização concreta em torno da âncora que, afinal, substituirá a regra atual, do teto de gastos.
“Estamos voltando a um mix de perda de âncora fiscal e monetária ao mesmo tempo, que não é um mix bom de se estar. Se a meta de inflação for elevada de forma que ninguém mais acredite que vai ser cumprida no seu centro, ou se começarmos a acreditar que o BC não vai ter mais autonomia de fato, porque a qualquer momento o Conselho Monetário Nacional (CMN) pode mudar a meta de novo, esse mix acaba gerando uma perda muito grande e rápida da confiança na economia”, avalia.
A economia da instituição financeira internacional considera que seria um “erro” se o CMN decidisse, na reunião de hoje (16), a primeira do ano, pela alteração das metas de inflação, uma vez que ainda há grande incerteza em relação à política fiscal. Diante dessa constatação, Solange avalia que uma eventual elevação das metas para um intervalo entre 4% e 4,5% serviria apenas para ‘deslocar’ as expectativas de inflação para o topo da meta, à medida que persista a indefinição da regra fiscal (arcabouço) que servirá de referência às contas públicas.
Na previsão do Credit Suisse, o IPCA – índice oficial de inflação – deverá atingir, ao menos, 5,8% este ano – que poderá ir a 6,4%, na hipótese de retorno da cobrança dos impostos federais sobre os combustíveis – e a 4% em 2024, desde que seja mantida a meta atual, de 3%. “Essa projeção vai mudar se a meta for mudada. Rapidamente”, previu a economista.
Sobre a eficácia na adoção de mudanças nas metas de inflação, como quer o governo Lula, a todo custo, Solange Srour explica que “quando você tem um risco fiscal elevado, e ele já começa a afetar as expectativas de inflação, a discussão de aumentar a meta de inflação é muito contraproducente, porque desancora ainda mais as expectativas e deixa a sensação de que há uma tentativa de puxar a Selic (taxa básica de juros) para baixo na marra”, critica.
Para a economista, a medida “é contraproducente, porque estamos começando a colher os frutos do juro real alto em termos de desinflação, mas vem uma discussão sobre mudança de meta em um momento em que estamos sem âncora fiscal e com uma incerteza muito grande sobre a sustentabilidade da dívida”.
Questionada se há ‘um nível razoável’ para o aumento da meta de inflação, Solange nega a possibilidade, ao argumentar “que qualquer mudança da meta vai acabar gerando a sensação de que, mesmo sem uma âncora fiscal, vamos tentar forçar a queda da Selic. Mesmo que seja 3,5%, vai trazer a sensação de que há uma tentativa de puxar a Selic para baixo, ainda que as expectativas continuem desancoradas”, explica. No caso de o percentual da meta subir para 4% ou 4,5%, ela considera isso “muito pior, porque a reação do mercado vai ser de elevar ainda mais as expectativas de inflação, e isso pode acabar até levando o BC a ter de subir os juros”.
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