Saúde
Eu, Eu Mesmo e Meu Lar: Desvendando os Efeitos da Vida Desacompanhada
Psicanalista aponta fatores que determinam a decisão e como esse comportamento tem revolucionado a sociedade e as maneiras de consumo.
Aquela crença automática de que quem vive só é porque não encontrou alguém ainda já não é tão real assim. Segundo o psicanalista Geraldo Peçanha de Almeida, está na hora de mudar essa visão.
Morar sozinho não é uma modinha, tampouco algo isolado. Trata-se de uma decisão de vida adotada por milhares de pessoas no Brasil e em outras partes do mundo.
Ela está associada a diversos fatores. Um deles, talvez, seja a noção de que os casamentos não são, necessariamente, sinônimos de alegria e felicidade. Muitos, inclusive, se reconhecem incapazes de gerenciar um e preferem a solidão.
Novos modos de vida foram se normalizando na sociedade, ao longo do tempo. Hoje, até mesmo idosos vivem só e são pessoas ativas, pois viajam, consomem e gastam com lazer e qualidade de vida.
Revolução
Aquela imagem antiga de um solteirona vivendo na casa dos pais, dos anos 1970, era o início de uma revolução atual. De maneira silenciosa, essas pessoas construíram o próprio jeito de viver, sem se importar para regras impostas pela sociedade, como a de que “cada panela tem sua tampa”.
O que mais ilustra esse fenômeno é a mudança da dinâmica da população. Homens e mulheres já não se sentem receosos diante da possibilidade de julgamentos ao ostentarem uma vida autônoma, sem casamento e sem filhos.
Por que a decisão de morar só?
Muitos tendem a pensar que essas pessoas não se encaixaram nos padrões de coletividade ou que são egoístas e apresentam diferentes dificuldades de relacionamento.
Por outro lado, existem, ao mesmo tempo, os que moram só não por opção, mas por falta dela, porque os respectivos companheiros e companheiras já morreram.
A compreensão desse fenômeno, no entanto, segundo Peçanha de Almeida, precisa ir além. O psicanalista alerta que esse comportamento precisa ser notado pelas políticas públicas, sobretudo pela noção de saúde coletiva.
“É preciso repensar toda a oferta de terapias e amparo psicológico para este grupo porque eles não são compreendidos ainda e nossas técnicas terapêuticas para eles estão obsoletas, já que a maioria não sofre por depressão nem solidão, conforme apontam os números; e 72% deles, por exemplo, acreditam que viver sozinho dá mais liberdades para gastar dinheiro, ou seja, o sujeito autônomo tem uma paixão e um comportamento de ter“, diz ele.
Impacto
Os desdobramentos desse modo de vida começam no consumo e no trabalho. Seis de cada 10 pessoas que moram só estão empregadas e possuem excelentes qualificações.
O hábito de consumir faz parte do dia a dia delas. As ciências terapêuticas ainda não conseguiram responder o porquê disso, mas é errôneo afirmar que seria uma tática para compensar a solidão.
Geraldo Peçanha aponta que quem vive só almeja coisas, como o bem-estar, ser feliz, sem filhos, sem casamento e sem relações afetivas fixas.
É triste?
Pode parecer uma vida triste para alguns, mas essas pessoas encontram satisfação na solitude e precisam ser compreendidas pelos diferentes segmentos da sociedade, sem preconceito e julgamento.
Algumas religiões já acolhem esse tipo de pessoa, especialmente as diretrizes mais novas que não exigem casamento ou induzem os fiéis a modelos tradicionais de família.
O comércio e a indústria também já se atentaram para essa parcela da sociedade. São pessoas que consomem de tudo e que se jogam sem culpa. Elas viajam, fazem cursos, gostam de tecnologia, moda, entre outros.
Hoje já existem porções de comidas individuais, das orgânicas às mais rápidas. Planos de saúde, títulos de clube, automóveis e bens duráveis de toda natureza já são pensados e construídos para quem optou por viver sozinho.
Psicologia
A sociedade já apresenta soluções, mas quando o assunto é amparo psicológico, de acordo com o psicanalista, o preconceito e o julgamento imperam.
O primeiro passo, segundo Peçanha de Almeida, é combater entre profissionais de saúde mental e educação a ideia de que quem vive só é triste e tem problemas de convivência.
“O que essa população de autônomos apresenta é: independência (25%); sensação de liberdade (23%); paz (12%); solidão (10%), tristeza (3%), abandono (1%), privacidade (50%). Ou seja, solidão e abandono não são, definitivamente, a característica mais importante deles“, aponta.
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